Eucalipto globulus: de Cacia para o mundo
A fábrica de Cacia elevou o eucalipto nacional a referência mundial do setor da pasta e papel.
Quando a fábrica de pasta de Cacia iniciou a sua produção, há 70 anos, a 23 de julho de 1953, poucos podiam prever que este projeto de “indústria-base”, com um cunho estratégico para reduzir a dependência externa do País, se iria tornar uma pioneira mundial e a génese de um cluster com forte vocação exportadora.
Na base da mudança esteve, por um lado, a visão da equipa de técnicos e de engenheiros da Companhia Portuguesa de Celulose (CPC), antecessora da The Navigator Company – mentora do projeto Produtores Florestais – e, por outro, a floresta nacional e uma espécie em particular, bem adaptada ao solo e ao clima do País: o eucalipto globulus.
No final de 1956, contra as convicções e os padrões da época – que menorizavam o valor da madeira de eucalipto para o setor –, este grupo dedicou-se à análise das condições de utilização desta espécie para a produção, em Cacia, de pastas cruas e branqueadas, bem como ao estudo das características papeleiras destes produtos.
Este trabalho, sigiloso e identificado apenas como “Projeto TE-24”, cedo produziu resultados. Os testes revelaram excelentes valores de brancura, opacidade e índice de mão, “com boas características de resistência e boa formação, que fazem prever uma fácil aceitação no fabrico de vários tipos de papel, cabendo na designação geral de papéis de escrita e impressão”, pode ler-se no relatório final. O documento vai ainda mais longe ao salientar também a adequação desta pasta para papéis de embalagem e tissue, o que revela o seu caráter francamente visionário.
Em janeiro de 1957, pela primeira vez no mundo, a CPC produzia à escala industrial uma inovadora pasta de eucalipto pelo método kraft, que viria a transformar todo o setor da pasta e do papel, impondo esta espécie como matéria-prima de excelência. Três semanas depois, nova estreia mundial: o fabrico de papéis de impressão com 100% de fibra desta espécie.
Um sucesso de eficiência e sustentabilidade
O papel originado pela pasta de eucalipto começou, no final da década de 1950, a ser o preferido por toda a Europa e, passadas cerca de sete décadas, não só o globulus é a espécie mais utilizada em Portugal para a produção de pasta e papel, como a Navigator é a terceira maior exportadora do país, líder europeia na produção de papel de impressão e escrita e líder mundial no segmento premium, sendo também a maior produtora europeia de pasta branqueada de eucalipto. O setor da Pasta e Papel assegura hoje, de acordo com o INE, 5% das exportações portuguesas e 56% das exportações do setor florestal, colocando os seus produtos em mais de 170 países.
Na base deste sucesso estão as características únicas da fibra curta do globulus. Como matéria-prima, esta é uma espécie com elevada ecoeficiência. Permite reduzir em 30% o consumo de madeira e diminuir o consumo de químicos (menos 20%) por tonelada de pasta de celulose, e suporta mais dois a seis ciclos de reciclagem, face a outras folhosas. Testes laboratoriais demonstraram que, mesmo após cinco reciclagens, a espessura de um papel de Eucalyptus globulus mantém-se superior face a um papel de fibra virgem de bétula.
Tendo em conta que vários países já tentaram plantar esta espécie, mas sem sucesso, o investimento na floresta sustentável de eucalipto globulus e no desenvolvimento tecnológico de produtos com base na sua fibra, proporciona a Portugal uma vantagem competitiva no âmbito da transição para uma bioeconomia circular de base florestal.