Potencial da utilização da resina natural
Este produto poderá representar uma receita adicional anual de 134 euros por hectare de pinhal conduzido para a produção de madeira.
A transição para uma economia mais sustentável, que responda aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas 2030, oferece inúmeras oportunidades para a revitalização de setores mais tradicionais da economia portuguesa, alicerçados na exploração de recursos naturais, como é o caso da produção e transformação da resina natural.
A resina de pinheiro é um dos múltiplos produtos do pinhal bravo do Centro e Norte de Portugal, e também do pinhal-manso nas áreas mais litorais, embora este, com uma menor expressão. O pinheiro bravo é uma espécie estruturante no contexto da floresta nacional, ocupando 673 mil hectares e representando cerca de 20% do total da área florestal nacional (IFN6), possibilitando a dinamização do desenvolvimento económico e social dos nossos espaços rurais, sendo que a extração da sua resina tem um peso muito relevante na economia local e nacional.
No século passado, entre as décadas de 1930 a 1980, assistiu-se a uma grande expansão industrial desta atividade, acompanhada por um considerável desenvolvimento tecnológico da resinagem e do aproveitamento da resina. O nosso país já foi o terceiro exportador mundial de resina e produtos derivados, com produções que atingiram as 140 mil toneladas na campanha de 1974-75. Posteriormente, nas décadas de 1990/2000 assistiu-se a uma quebra acentuada da produção, resultante de múltiplos fatores, sendo, o principal, a entrada de resina proveniente da China e, posteriormente, do Brasil, nos mercados internacionais, a preços muito mais competitivos que a resina portuguesa, o que determinou o valor mínimo de 17 cêntimos/kg, atingido em 1990 (ver gráfico).
A resina é uma interessante fonte de rendimento para os proprietários florestais, especialmente nas zonas de minifúndio, contribuindo para a criação de emprego e de empresas de base local. Durante o período de estio, o resineiro realiza operações manuais de resinagem com o objetivo de recolher, limpar e acondicionar a resina dos pinheiros, seguindo posteriormente para a indústria de primeira transformação. Atualmente, estima-se que a produção de resina poderá representar para o proprietário uma receita adicional anual de 134 euros/ha, correspondendo a cerca de 30-35% das receitas totais do pinhal conduzido para a produção de madeira.
Produção e transformação em Portugal
Na primeira transformação a resina proveniente do pinhal é sujeita a vários processos físicos de filtragem e destilação, com vista à separação das suas duas frações: a fração terpénica – terebentina ou aguarrás e a fração resínica – colofónia ou pez-louro. A colofónia e aguarrás são posteriormente sujeitas à segunda transformação em indústrias químicas especializadas, de forma a produzir produtos derivados com características específicas para diferentes aplicações. Trata-se de uma atividade “business-to-business” em que os produtos da segunda transformação da resina são adquiridos por outras indústrias que os incorporam em produtos para o consumidor final. Relativamente às suas aplicações, são várias, e vão desde a cosmética e higiene (perfumes e cremes), à alimentar (pastilhas elásticas e refrigerantes) e agrícola, passando por aplicações ao nível da produção de embalagens, entre outros (vestuário, acessórios de moda, calçado, capacetes, lentes e instrumentos musicais) e também indústria química (colas, vernizes, elásticos, pneus).
As indústrias de segunda transformação a operar em Portugal especializaram-se sobretudo na transformação da colofónia e detêm uma capacidade de transformação instalada muito superior à produção de resina nacional, o que levou a que, em 2018, o volume de importação de colofónias e ácidos resínicos atingisse as 55.092 toneladas. Nos mercados internacionais, a resina natural compete com a resina derivada do petróleo. Todavia, perspetiva-se uma procura crescente e maior valorização de produtos de origem “bio”, tais como os derivados da resina natural, reconhecendo a sua importante contribuição para o desenvolvimento e sustentabilidade económica, social e ambiental do meio rural.
Atualmente e apesar de todos os constrangimentos, a produção de resina natural tem maior expressão em Portugal e Espanha, ao nível da União Europeia. Portugal decidiu apostar neste setor ao incluir a dinamização da resina natural no PRR – Programa de Recuperação e Resiliência, mais concretamente na Componente 12 (Bioeconomia Sustentável), com o objetivo de se assegurar uma maior competividade neste setor, contribuindo para a transição e neutralidade carbónica de forma justa e coesa. Simultaneamente, será necessário fomentar a revitalização de toda a cadeia de valor, com vista à sua maior modernização, inovação e incorporação de conhecimento técnico-científico. Este é um dos objetivos centrais do Consórcio RN21, liderado pelo CoLAB ForestWISE e recentemente aprovado pelo Fundo Ambiental e que integra 39 parceiros, com um total de 26,8 milhões de euros de investimento.
A aposta na resina natural nacional, ao invés de outro tipo de resinas ou de outras origens, deve ser olhada como uma oportunidade para o nosso país, uma vez que se pretende valorizar toda a cadeia de valor, desde os produtores ao mercado, desenvolvendo-se iniciativas para aumentar a produção da resina em Portugal, com o objetivo de garantir os níveis de autoabastecimento à indústria e, posteriormente, ao mercado, e também apoiando a gestão florestal sustentável, reduzindo o risco de incêndio, dinamizando o desenvolvimento do mundo rural e contribuindo para a coesão territorial.
Artigo da autoria de Carlos Fonseca, Marta Martins e Alexandra Marques, do ForestWISE – Laboratório Colaborativo para a Gestão Integrada da Floresta e do Fogo (UTAD), publicado originalmente na revista Produtores Florestais nº 9, de novembro de 2022, que pode descarregar aqui.